“As outras alfabetizadoras da minha escola quiseram saber que tipo de milagre eu estava usando e aderiram às histórias, relatando os resultados altamente positivos a professoras de outras escolas”

Meu nome é Cleunice. Sou professora, aposentada desde 91 e moro em Mirassol — SP.

Enquanto estive à frente de uma sala de aula, acabei compondo um material para alfabetização; e tive de criar alguma coisa porque naquele ano, a classe que me foi destinada era formada apenas por alunos… Aqueles! Aqueles que estavam há três, quatro… Até sete anos na escola sem conseguir aprender coisa alguma. Nem a letra a eles reconheciam entre as vogais.

Na época, se o aluno não soubesse o suficiente, era reprovado. Era bomba mesmo, sem este protecionismo nocivo que inventaram para camuflar a incapacidade dos dirigentes.

Fui tomada pelo pânico. Era a 1ª vez que enfrentava tal tipo de classe e não tinha nada de novo a apresentar! Novidade nenhuma, carta nenhuma escondida na manga; as novidades interessantes já haviam sido usadas pelas professoras anteriores daqueles mesmos alunos e não surtiram efeito; se tivessem surtido, eles não estariam ali, outra vez tentando aprender a ler e a escrever.

Sem saber por onde começar, comecei pelo método usado na época — a cartilha Caminho Suave —, que começa pelas vogais, encontros vocálicos e depois parte para a silabação. Mas, dois meses depois, aqueles alunos estavam como no primeiro dia de aula: sem saber nada!

Em abril, passei a usar outro método que eu também conhecia de longa data: a Cartilha Sodré. Inicialmente, este método usa apenas a letra a e, com esta vogal apresenta todas as consoantes e todas as dificuldades antes de passar à vogal seguinte. Com a Sodré, meus alunos começaram bem, reagiram favoravelmente — certamente por causa da novidade, pois que desconheciam o método Sodré — mas foi por pouco tempo, porque depois empacaram de vez. E já era agosto!

Eu procurava avidamente alguma coisa que pudesse levá-los à aprendizagem, mas debalde!
Acontece que os autores não escrevem para estudantes fracos. Preferem atingir alunos medianos e fortes por ser mais fácil lidar com eles e por representar faixa maior do mercado e, consequentemente, maior fonte de lucro. Os alunos mais lentos ninguém até então havia ligado pra eles.
Ou então, o que é mais cômodo: a exemplo da maioria quase maciça das “autoridades” educacionais, os autores fingem desconhecer a existência dos alunos lentos e, se a professora os menciona, corre o risco de ouvir que alunos fracos existem por culpa dela mesma, a professora!!!

O fato é que ninguém havia até então, criado algo para alunos com deficiência no aprender.

Fazia tempo que eu vinha tendo algumas ideias diferentes, que poderiam ser colocadas em prática na alfabetização, no entanto nunca houvera necessidade, pois nós tínhamos dois métodos (Sodré e Caminho Suave) que davam conta do recado muito bem, não havia necessidade de nada além.

Mas agora era uma emergência! Eu já havia me utilizado dos dois métodos e não havia mais nenhum instrumento do qual eu poderia lançar mão.

Entendi que era hora de criar algo diferente; um meio de alfabetizar que atraísse a atenção dos aprendizes de tal forma, que acabassem por assimilar os conteúdos. E falei com a direção da escola sobre as dificuldades da classe e minhas ideias sobre um novo método. O diretor, Sr. Sebastião Roberto Iglesias, me apoiou, colocou a escola à disposição para o que eu precisasse.

Conhecendo profundamente ambos os métodos Sodré e Caminho Suave e mais as quase três centenas de cartilhas que são plágio descarado deste último —, eu conhecia também todos os seus pontos positivos e os pontos negativos, assim como das outras cartilhas todas.

Aqui, uma observação: Temos pouquíssimos métodos de alfabetização brasileiros.

“Sodré” e “Caminho Suave” são brasileiros — e não simples cartilhas. Suas autoras: Benedita Stall Sodré e Branca Alves de Lima, estas sim, criaram; estas sim, são autoras de alguma coisa. Tudo o que se fez depois — centenas de cartilhas — são cópias, são imitações vergonhosas da “Caminho Suave”. Iniciam todas de maneira igual, desenvolvem-se de maneira igual e acabam tudo igual. Mudam as palavras chaves, mudam as figuras, muda o título, a editora, o autor, mas o método continua sendo “Caminho Suave” de roupa nova. Daí, as professoras mudavam de cartilha todo ano procurando algo diferente e, quando percebiam, estavam trabalhando igualzinho ao ano passado, ao ano retrasado: com “Caminho Suave” de outro autor.

Continuando:

Eu tentaria uma tarefa hercúlea não conseguida ainda por nenhum outro autor: reunir somente pontos positivos, e sem nenhum dos pontos negativos apresentados pelos dois métodos.

Seria tentar o impossível desde todos os autores sonham conseguir o mesmo.

E o que ninguém realizou antes, foi realizado no “Professora de Papel”.

Descobri, pois, as teclas que, acionadas ao mesmo tempo, conseguem alfabetizar também aluno com deficiência mental não profunda, como era o caso da minha classe naquele ano.

Assim, comecei a alinhavar meu método de ensino. Passei a inventar historinhas e a contá-las em sala de aula. Aquelas que surtiam efeito, eu escrevia. As que surtiam efeito indesejado eu anotava também com ressalvas e comentários, para não vir a reprisar o erro no futuro.

Somei tudo o uso da fonética (aprendida não no Curso Normal, nem na Faculdade, nem nos inúmeros cursinhos de capacitação — mas em aulas de Taquigrafia em Curso de Contabilidade quando adolescente!)

Comecei a ministrar as novas aulas e os alunos começaram a aprender! Aprendiam tanto e com tanta rapidez, que cheguei a duvidar que estivessem aprendendo de verdade; acreditei que sabiam que eu estava compondo um novo método e estivessem me enganando, só para me agradar!

Mas é impossível fingir que se sabe aquilo que se ignora. Era aprendizado de verdade! Tratava-se, para aquelas crianças, das primeiras experiências válidas em leitura e escrita, depois de tantas tentativas.

Animados pelos primeiros êxitos, os alunos passaram a se interessar mais e a aprender mais.

Nada é tão motivador para o aprendiz, quanto a própria aprendizagem.

Naquele ano de nascimento do método não consegui grande coisa; o leitor há de se lembrar que somente em agosto — decorrido mais da metade do ano — foi que dei início às primeiras tentativas. Mas o que consegui deixou a mim, aos alunos e à escola, exultantes: cinco daqueles alunos “fracassados” conseguiram ir para a 2ª série sabendo ler e escrever.

Repito com prazer: cinco daqueles alunos condenados ao analfabetismo passaram para a 2ª série! Era uma 2ª série fraca, mas eles foram se ajeitando e seguiram adiante com os outros.

Quanto aos demais alunos daquela classe, estes já estavam no meio do processo; liam e escreviam palavras e orações. Era pouco, mas eram verdadeiras conquistas para quem não conhecia a letra a.

O janeiro seguinte, férias escolares, passei escrevendo novas histórias e melhorando aquelas que já existiam. E, no ano que começou, logo no 1º dia de aula entrei contando histórias.

As outras alfabetizadoras da minha escola quiseram saber que tipo de milagre eu estava usando e aderiram às histórias, relatando os resultados altamente positivos a professoras de outras escolas.

Naquele ano ainda, mais três escolas da minha cidade conheceram o método e passaram a usá-lo.
No ano subsequente, professoras de cidades vizinhas — São José do Rio Preto e Cedral — estavam contando minhas historinhas e passando a notícia de um novo método às cidades próximas.

Três anos depois — em 87 — fiz a 1ª edição do material, que já havia recebido sugestões de melhorias das novas usuárias. Fiz só 150 exemplares da professora e 1.000 do aluno, os quais distribuí gratuitamente. Acreditei que, com isso minha missão na Terra estava cumprida e o método morreria aí.

Eu me enganei, porém! Foi aí que tudo começou porque outras e outras professoras ficaram sabendo da existência de um método surpreendente e passaram a me telefonar pedindo material. Outras queriam livro de 2ª série que lhe desse continuidade; outras queriam um livro intermediário entre a 1ª e a 2ª séries; outras pediam livros para 3ª e 4ª séries. E havia quem pedia material de Matemática!!!
E continuei escrevendo e editando — tudo do bolso meu e do meu marido —, porque aí já entrou em cena o construtivismo e nenhuma editora quis arriscar jogando num método independente.

Com a chegada das teorias de Emília Ferreiro, baixou verdadeira Idade Média na educação e as fogueiras da Inquisição passaram a ser acenadas às docentes que usassem algum material não construtivista.

Mesmo assim, professoras mais corajosas driblavam as ordens vindas de cima e continuavam adotando o “Professora de Papel”, que continuou agindo por baixo da cortina e se alastrando lentamente, chegando às mãos das alfabetizadoras quase às escondidas. Muitos desentendimentos aconteceram entre usuárias e seus superiores pelo motivo alegado. Mesmo assim, o “Professora de Papel” seguiu seu caminho sendo barrado aqui e elogiado acolá — mais barrado do que elogiado, por não obedecer às normas emilistas. Mas nunca deixou de circular.

Hoje, o “Professora de Papel” é conhecido em todos os estados do Brasil e até fora do país sem propaganda nenhuma, sem oferecer exemplares de brinde como fazem as editoras — e tendo ainda de vencer os obstáculos criados pelas autoridades. Somente graças à coragem, ao heroísmo e à obstinação de algumas professoras mais entusiastas, este material continua vivo.

Aliás, além de pagar pelo material, estas professoras pagam também pela taxa do correio, tudo para não deixar morrer um método de ensino que elas reconheceram válido.

Obrigada, colegas professoras! Vocês são verdadeiros Anjos da Guarda do Ensino!

Portanto, o método das historinhas, o “Professora de Papel” tem histórias a contar! Ah, se tem! Foi barrado, proibido, condenado, execrado, abominado por almofadinhas que nunca lecionaram, nunca meteram a mão na massa para provar da receita que prescrevem.
Quase deixou de circular, quase foi vencido pelo construtivismo que, em mais de 30 anos empurrado goela abaixo das professoras, não conseguiu provar ser o melhor jeito de alfabetizar.

Diz um ditado: Se uma força contrária for muito grande, não resista. Saia de lado e espere ela passar pois, se ela for mesmo muito grande cairá sozinha, com o próprio peso.”

Foi o que aconteceu ao construtivismo. Caiu sozinho, do alto de toda sua grandeza.

Depois que Emília Ferreiro foi desmascarada, a LDB (Leis de Diretrizes e Bases da Educação) admitiu seu engano e abriu facilidades para outros métodos que ainda poderão salvar o ensino. Assim, cada professor voltou a ter liberdade na escolha de métodos e o “Professora de Papel” retorna como nos primeiros tempos após um período negro, após aquela Idade Média Educacional.
Este material poderia ter auxiliado muita gente e o ensino não teria chegado a ponto tão rasteiro não fosse o fanatismo de quem ditava leis de ensino sem jamais ter visto uma criança de perto.

Mas venceu o bom senso. As professoras podem respirar porque não mais serão tolhidas em sua liberdade de escolha.

Com isso, de janeiro a janeiro recebo pedidos de livros de partes do país que jamais ouvira falar.

Já foi vendida uma edição do método “Professora de Papel” para a FAE, que continuou a fazer pedidos, os quais não foi possível atender por falta de meios para produzi-lo em larga escala.

E até o presente momento não encontrei editora disposta a acreditar no poder deste método que, com certeza, virá a ser o maior best-seller nacional. Os editores estão ainda se recuperando do prejuízo da época de “inquisição” quando houve verdadeira caça às bruxas de livros de alfabetização que são impressos em maiúsculas de forma, demonstrando obediência às normas construtivistas. Certamente os editores não acreditam que a liberdade oferecida pela LDB seja pra valer.

Mas tudo tem sua hora e vez. Não é possível que o “Professora de Papel”, que já venceu obstáculos bem maiores não venha a ter seu valor reconhecido justo agora, que vivemos em pleno Renascimento Educacional, justo agora que o construtivismo é que está sendo banido das escolas exigentes, das instituições sérias, das Secretarias de Educação comprometidas com qualidade.

Enquanto isso vou produzindo, vou vendendo no varejo a quem o solicitar.

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